António Luiz Rafael, presença constante da memória televisiva, dá-nos uma vez mais a conhecer a sua faceta de romancista, trazendo até nós agora o seu terceiro romance. Autor de “Sara e a Paixão – Entre o Alentejo e Moçambique” e “As Horas dos Tempos”, em ambos as histórias nos transportam para a referência a África, marca incontestável deste continente na vida do autor. Subjacente sempre a magia que no imaginário coletivo se associa ao continente africano, também no presente romance encontramos essa referência, havendo uma personagem que é neste continente que vivencia uma felicidade pessoal e profissional.
Sem querer levantar o véu da história, deixando ao leitor o caminho livre para a sua descoberta, neste conto largo, como o autor o designa, acompanhamos a vida de personagens que nos trazem uma outra experiência, a da música. Ao ler as passagens, envolvemo-nos na descrição, fazendo- nos sentir presentes nos concertos, sentimos a música como se na realidade ela estivesse a ser tocada e deixa-nos mais ricos. Revisitamos lugares e lembramos compositores, ganhando na leitura a evasão que só um bom livro nos dá.
[Graça Viegas]
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Mas voltando ao tema da desafinação do piano. Madalena também passou a notar que quando tinha de teclar a zona do Ré sustenido o som era menos activo, como se algo estivesse a evitar que a percussão se fizesse convenientemente. Curiosa, resolveu dar uma vista de olhos ao interior do instrumento, procedimento relativamente simples pois havia apenas que levantar a tampa que se movia por intermédio de duas dobradiças e seguidamente retirar o painel frontal que assentava num vulgar encaixe. Feito isto, ali tinha à vista as oitenta e tal peças de madeira cobertas de feltro (designadas por “martelo”) que, manobradas a partir do teclado, batiam nas cordas bem tensas pela afinação, produzindo assim o som desejado. Só que neste caso, e para surpresa de Madalena, esta verificou que entre duas das cordas, e um pouco de esguelha, se encontrava entalado um pequeno livro. A que propósito tal coisa tinha ali ido parar e, mais, qual seria o conteúdo?